sábado, 21 de fevereiro de 2009

Audi TTS





Fala sério: em se tratando de um meio de locomoção, este Audi TTS é o cúmulo do desperdício. Prestes a desembarcar no Brasil, o cupê conversível comporta apenas dois passageiros e mantém o estilo lançado há dez anos e renovado em 2007, com os contornos arredondados e futuristas que consagraram o modelo. Mas, se a questão for uma máquina feita para proporcionar prazer ao volante, podemos dizer que ele está na medida. Se antes faltava aos TT um punhado de cavalos a mais para que ele pudesse se tornar um rival à altura dos Porsche Boxster e Cayman, duas referências nesse segmento, agora os complexos ficaram para trás em alta velocidade: com 272 cv, o TTS ganhou 38% de potência em relação ao mais possante dos cupês conversíveis da série.
Entre os Audi, a letra S é sinônimo de desempenho. Com 27 cv a mais que os dois Porsche, ele faz, segundo a fábrica, de 0 a 100 km/h em 5,6 segundos – 5 décimos mais rápido que os rivais. Em casa, leva a melhor até sobre o TT 3.2 e seus 250 cv. E com a vantagem de beber quase 20% menos. Em um mundo cada vez mais preocupado com consumo e emissões, é um atributo e tanto. O surpreendente é que o TTS consegue dar esse show de desempenho com os mesmos quatro cilindros das versões menos bravas. Tudo graças ao belo trabalho de engenharia, que adicionou turbo, intercooler e um retrabalho na eletrônica.
O ronco grave do turbo e o torque de 35,7 mkgf entre 2 500 e 5 000 giros já tinham causado uma boa impressão, a sensação foi ainda melhor ao acelerar o TTS por um trecho de 100 km da A13, a autoestrada que leva rumo ao canal da Mancha. É o tipo de situação em que se pode sentir o significado da relação de 5,3 kg/cv combinada com tração integral.
Se eu seguisse apenas meus impulsos, em segundos seria capaz de chegar a seus 250 km/h de velocidade máxima. Acontece que estou em uma região na qual os radares estão por todos os lados. Ok, mesmo a 130 km/h já dá para ter um bocado de diversão. Sem sair dos limites de velocidade, é possível retomar de 80 km/h a 120 km/h em 4,4 segundos. Nada mau.
As sensações são ainda mais intensas com a capota de lona recolhida. A um toque de botão e até os 30 km/h, é possível ficar em contato direto com o espaço. A transmissão automatizada S tronic é expedita ao providenciar os engates das seis marchas, que também podem ser efetuados por alavancas no volante. Ela é acionada por duas embreagens (sistema DSG) que funcionam simultaneamente. Enquanto um cuida das marchas ímpares, o outro trabalha nas pares, economizando tempo nos engates, precisos e fáceis.



O resultado dessa receita é um carro ágil e bastante reativo, mas longe de ser indomável. A partir dos 120 km/h, o aerofólio traseiro é acionado, melhorando seu perfil aerodinâmico. A versão que experimentamos, topo-de-linha, também sai de fábrica com o sistema de amortecedores magnéticos adaptativoscom duas posições, uma padrão, outra esportiva. Esta última rebaixa o carro em 10 mm e o deixa rente ao asfalto e espertíssimo, ainda mais com o controle de estabilidade desligado. Aí o TTS vira o bicho.
Por fora, este Audi, com carroceria mezzo aço (na traseira), mezzo alumínio (na dianteira), ostenta diferenças minimalistas se confrontado com a versão mais mansa. Tem só 2 cm a mais de comprimento e é equipado com rodas de alumínio de 18 polegadas, com faróis, lanternas e pisca-piscas dos retrovisores com LEDs. Dá um belo visual e melhora a visibilidade.
Por dentro, os assentos de couro bege, com costura grossa, realçam seu estilo esportivo. Nesse espaço, cabe quem dirige e mais um acompanhante. E só. Mas, quando o assunto é conforto e ergonomia, o TTS arrasa. Seguindo a receita dos mais recentes modelos da Audi, o volante revestido de couro tem a base achatada e três raios (com contornos de alumínio). O efeito é bonito e a empunhadura, eficiente. Pode ser regulado em altura e em distância. O som Bose, com rádio toca-CD e entradas USB, dispensa apresentações e manda bem. Mesmo na rodovia, com o teto abaixado, a qualidade da música agrada aos ouvidos mais exigentes. E razoáveis 290 litros no porta-malas comportam a bagagem de viajantes de fim de semana. Se preciso, o compartimento de carga pode integrar-se à cabine, dobrando sua capacidade.


Uma compensação são os sensores de manobra no parachoque traseiro. E deverá custar caro, ainda mais com o real, de ressaca pela inesperada maxidesvalorização desde outubro. Na Europa, um TTS como o que avaliamos custa 50 000 euros. Por aqui, onde sua chegada está prevista para o primeiro semestre deste ano – já estão sendo feitos testes de adaptação do motor com injeção direta com nossa gasolina –, ele deverá sair por algo em torno de 310 000 reais, a depender da cotação do dólar na época. Quem sabe até lá a Bolsa não reage...





Ford Ka Europeu





Falaram mal do novo Ka brasileiro quando ele foi lançado, em dezembro de 2007. Diziam que era uma reforma de terceiro mundo, que estragava a receita original do europeu – uma receita preciosa, que já faz dele um clássico do nosso tempo: um carro que durou 12 anos sem mudanças, amado até o fim. Mas o fim chegou. Em outubro, foi a vez de os europeus enfrentarem o desafio de reinventar o mito. O carro da foto é a resposta deles.
Enquanto o Ka brasileiro dá nova aparência às peças do modelo antigo – algumas bem visíveis, como parabrisa e portas –, o Ka europeu não aproveita nada. Nem plataforma, nem motor. Aliás, aproveita sim, quase tudo, mas de outro carro. O Fiat 500. Os dois nascem na mesma fábrica, na Polônia. Fora as peças visíveis de carroceria, os dois são iguais. Repare no quadro de instrumentos, vindo diretamente do nosso Palio. E não importa se a capa de plástico do motor diz “Duratec”, embaixo dele está o Fire de 1 242 cm3, que usávamos no Palio.
Então o novo Ka europeu é isso, um Fiat disfarçado? Não. Talvez empenhada em vencer as críticas prontas do público europeu (lá também tem disso...), a Ford trabalhou pesado na personalização do ajuste de chassi. Quem andou nos dois carros diz que Fiat 500 e Ford Ka são bastante diferentes.
Verdade que o desenho novo do Ka não é polêmico como o anterior. Dá vontade de pegar no colo. Mas isso é porque se trata de uma versão bebê dos novos Fiesta, Focus e Mondeo: faróis esticados, carroceria com formas revoltas, traseira curta e um bigodinho preto como pára-choque. Não é um divisor de águas, em estilo ame-o-ou-deixe-o, como era o original. O Ka brasileiro também não é. É simpático, mas nadaousado. E, por dentro, virou um legítimo carro de baixo custo, com plásticos moles e mal encaixados.



O Ka europeu também mudou muito. Os plásticos não são tão elaborados quanto os do novo Fiesta, mas ficou requintado. Não se vê mais a pintura do carro de dentro da cabine. Pintura automotiva, se existe, é o branco perolizado que colore parte do console e os puxadores de porta, nessa versão Tatoo. Os dois carros evoluíram para atender às suas novas realidades. No Brasil, os jovens precisam pensar no valor de revenda (e compram carros com quatro portas mesmo sem usar) e, se têm carro, talvez já estejam mais maduros – e pensem em ter família. Daí que ele passou a ter cinco lugares. Na Europa, sobressai a vontade (e a capacidade financeira) de o jovem expressar sua individualidade.
Mas, afinal, quem foi mais fiel ao Ka? Essa pergunta pede outra: o que fez do antigo carro uma referência a ser seguida? Quatro coisas: design radical, descompromisso com a praticidade, preço baixo e prazer ao dirigir. O novo Ka europeu ganha do brasileiro nas duas primeiras. Mas proponho ir mais longe, e resumir a receita a um item apenas: a experiência ao dirigir crua e direta. É isso que sugere o nome “Ka”, uma forma bem enxuta de dizer a palavra “car”.


Numa pista travada, com motores equivalentes, o Ka europeu deve andar na frente. Tem mais recursos técnicos. Para ficar em um bem simples, ele tem barra estabilizadora na frente e atrás. O brasileiro não tem nenhuma. O europeu é mais maduro, inspira maior segurança e é mais confortável. Os bancos são mais altos e o espaço interno, mais generoso. Mas o Ka original não é exatamente isso. É um carro direto, tão sincero que é capaz de mostrar ao dono se gosta dele ou não: andar rápido com o Ka é coisa para quem conhece, não para quem comprou. Assim como guitarras ou raquetes de tênis. Nisso, o Ka brasileiro é melhor que o europeu.