sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Lamborghini Gallardo




A estrada se abriu como um tapete vermelho diante dos meus pés, só esperando pela pisada sonora no acelerador. O urro explosivo do motor V10 espantou os abutres do céu do Arizona (EUA) como um trovão sobre o deserto. Era o Lamborghini Gallardo Superleggera, que marcava no velocímetro proibitivos 275 km/h.
Lançada no Salão de Genebra de 2007, essa fera parecia mais que um Gallardo atualizado com alguns quilos a menos e alguns cavalos a mais. Ao aprimorar o que já era um dos melhores esportivos do mundo, a companhia de Sant'Agata formatou a essência do desejo. E eles estavam orgulhosos o suficiente para exibi-la no calor de derreter do autódromo internacional de Phoenix e nas belíssimas estradas do deserto. Fomos para o asfalto de 40 ºC só para descobrir quanta diferença faz aliviar 100 quilos de peso numa máquina que já exauriu o suprimento de termos superlativos da mídia. O Superleggera - um nome que não era visto desde os anos 60 e que se traduz literalmente por "superleve" - é o primeiro bebê do presidente da empresa, Stephan Winkelmann. Num carro de 1 330 quilos, em vez de tirar ar-condicionado, vidros elétricos e carpete, a Lamborghini preferiu reduzir o peso retrabalhando cada peça para criar um foguete de rua confortável em vez de uma arma de pista a toda velocidade.
Eles fizeram novos eixos de tração, rodas Skorpius de pouco peso e parafusos de roda Titanium mais leves, que eliminaram só uns poucos gramas do conjunto, mas são considerados vitais para seu alto desempenho. Claro que jogar o sistema de tração nas quatro rodas no lixo poderia ter livrado mais 100 quilos num estalar de dedos e transformado o carro num psicopata violento, em vez de um instrumento cirúrgico. Mas a tração total agora é parte integral do DNA Lamborghini. Faixas de fibra de carbono cobrem o cockpit, onde 47% da redução de peso foi feita. Os antes luxuosos revestimentos se foram, substituídos por um painel simples de material leve de corrida. Os assentos, que eram tão aconchegantes quanto os de um sedã familiar, foram retirados em favor de outros de corrida da espessura de uma bolacha recheada.
O regime continua no exterior, onde o policarbonato substituiu o vidro em cada lugar possível. Agora as tomadas de ar, soleiras, corpo dos espelhos retrovisores e outros acessórios de fibra de carbono unem forças com um aerofólio traseiro fixo opcional para acrescentar ainda mais ameaça ao desenho afiado.


O anguloso Gallardo foi uma revelação quando lançado: mais justo, compacto e conservador que o excessivamente musculoso topo-de-linha Murciélago - e ainda melhor em tudo por causa disso. Agora ele parece realmente parrudo sem perder o sutil apelo que fez dele uma sensação de vendas e um dos responsáveis pela renascença da marca. O Gallardo pode ser considerado o mais belo esportivo do mundo no momento. E os meros toques do Superleggera só serviram para ressaltar sua beleza.
Jogue o Gallardo com tudo numa curva tarde demais e ele ainda grudará como massa de macarrão de uma semana atrás. A direção que dava uma sensação telepática agora alcançou plano maior de consciência e faz carros de corrida parecerem imprecisos. Suspensão mais firme e perfil mais duro dos pneus Corsa, comparados aos PZero de série usados no Gallardo, significam que a arrancada gradual da versão original é algo do passado. O controle de tração vai dar conta de quase qualquer saída de traseira que você conseguir provocar. Ele segurou as derrapagens até com pneus desgastados e com bolha, resultado inevitável de andar forte num circuito fechado.
Desligar o ESP proporciona uma experiência geral mais divertida, se você for bom o suficiente, mas o Superleggera pede pares de mãos e pés mais preparados. Da mesma forma, se você encomendou a versão apimentada, é exatamente isso que você deve querer, já que até um chimpanzé conseguiria contornar as curvas com o modelo básico.
Esse é o toque humano na Lamborghini que sobreviveu à aquisição pela Audi em 1998. O homem que ainda ama voar baixo com suas próprias criações é uma das principais razões pelas quais os lucros dispararam mais de 300% no ano passado.


Ele entenderia que a ação na pista não saciou a necessidade de velocidade e que o motor V10 é tão viciante que deveria trazer um alerta do Ministério da Saúde. Assim que o carro ganha a reta e o conta-giros chicoteia para a direita, todos os pensamentos sobre a direção levemente trepidante sumiram enquanto eu era arrastado numa onda de aceleração violenta de deixar os cabelos em pé. Graças ao motor de 530 cv, ele vai voar para 100 km/h em 3,8 segundos - 0,2 segundo mais rápido que o Gallardo, e isso é muito. Embora a máxima de 315 km/h continue a mesma, é seguro dizer que o carro chegará lá bem mais fácil.
A batida estridente do V10 em aceleração era o estímulo de que precisava para extrapolar os limites da minha sanidade nas estradas do Arizona. A Lamborghini pode não ser tão cultuada quanto a Ferrari em termos auditivos, mas o urro cruel e mecanizado dos escapes mais leves do Superleggera, conforme a agulha chega a 8 000 rpm, curaria até os surdos.
Tudo que o motorista pode fazer é assimilar o barulho e agarrar os paddle-shift de aparência meio barata do câmbio seqüencial e-Gear, que cumpre um papel admirável entre a facilidade de uso e a pura velocidade. Na cidade, o conjunto se livra das reduções automáticas de marcha de um jeito agressivo, com batidas vindas lá de dentro da caixa. Mas a opção automática ainda é de longe a escolha mais simples para o uso diário.
A única trinca na armadura desse carro foram os freios de carbono-cerâmica. Mais de uma vez cutuquei de leve o pedal esquerdo ao chegar ao semáforo, antes que um empurrão nervoso parasse o carro. Os freios de aço inevitavelmente ofereceriam melhor resposta, mas a Lamborghini alega que a única vantagem do sistema de cerâmica - mais caro - é que eles não apresentarão fadiga no uso contínuo em pista.


Custando 158 000 euros, o Superleggera pesa 20% menos que o modelo de série e provavelmente nem vale tanto, já que o Gallardo básico é carro mais que suficiente para qualquer um. Porém a produção de 400 unidades do primeiro ano já está vendida. Os consumidores da Lamborghini querem o carro mais brutal, ou nada. E a diferença de preço não parece importar. Às vezes, uma compra emocional como essa é tão difícil de justificar como correr a 270 km/h numa estrada americana intensamente policiada. Se eu tivesse o dinheiro, selecionaria a versão mais arisca e apimentada do mais desejado esportivo do mundo. Bem, para mim isso seria tão natural quanto respirar.






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